sexta-feira, 24 de junho de 2016

SOBRE A NECESSIDADE DE PLANTAR ÁRVORES

Zildo Gallo


Hoje, 24 de junho de 2016 (dia de São João), um dia ensolarado de inverno e com temperatura amena, diante da grave situação de aquecimento global (efeito estufa), afirmo que é cada vez mais necessário e cada vez mais urgente o plantio de árvores, muitas árvores, pois elas incorporam carbono nos seus tecidos lenhosos após retirá-lo (gás carbônico) da atmosfera no processo de fotossíntese. Quanto mais árvores forem plantadas tanto mais gás carbônico será retirado do ar, contribuindo para o rebaixamento gradual da temperatura do nosso planeta. Por conta disso, que é uma das minhas preocupações centrais enquanto professor de economia ecológica no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Territorial e Meio Ambiente (Mestrado e Doutorado) da Universidade de Araraquara (UNIARA), resolvi reproduzir duas publicações antigas do meu blog que tratam do assunto em questão. A primeira trata-se de um artigo onde falo sobre os serviços ambientais prestados pelas florestas e sobre a necessidade do urgente reflorestamento do Estado de São Paulo (As árvores ausentes e a monotonia dos canaviais); a segunda trata-se de um poema onde lanço críticas sobre a monocultura canavieira do Estado (Canção do exílio rural - um poema muito concreto) que, no meu entendimento, destrói a biodiversidade de amplas áreas do seu território. Ao artigo e ao poema!

AS ÁRVORES AUSENTES E A MONOTONIA DOS CANAVIAIS

Zildo Gallo

Publicado em 4 de dezembro de 2014


As florestas com suas árvores prestam inestimáveis serviços ecossistêmicos, também denominados ambientais, para o planeta e, por óbvia extensão, a todos os seres humanos. Tais serviços podem ser divididos em quatro grupos a saber: regulação, provisão, suporte e culturais.
Serviços de regulação. Dizem respeito à estabilização e manutenção dos ecossistemas para que eles continuem exercendo o seu papel de forma ininterrupta e previsível. As matas protegem as nascentes, as margens dos corpos d'água e os topos de morros e, assim, ajudam na conservação da água doce, que é um bem essencial à vida. As árvores que ficam nas encostas de terrenos com declives acentuados ajudam na estabilidade do solo, evitando desmoronamentos; aqueles que já tiveram as suas casas destruídas com quedas de encostas bem sabem o significado disso. A evapotranspiração (retirada de água do subsolo e posterior liberação na atmosfera) ameniza a temperatura local e, ao mesmo tempo, ajuda na formação de nuvens, contribuindo para o bom funcionamento do ciclo hidrológico. Em tempos de aquecimento global, os tempos de hoje, as suas árvores têm um papel de altíssima relevância: retirada de gás carbônico do ar e armazenamento duradouro nos seus tecidos lenhosos, o que contribui para diminuir a retenção de calor na atmosfera pelos gases do efeito estufa.
Serviços de provisão. As árvores das matas fornecem frutos, óleos, madeira e fibras, que se transformam em alimentos e matérias primas para a produção de muitos bens. A indústria moveleira, da construção civil, de papel e celulose, de produtos farmacêuticos, de alimentos, de cosméticos, entre várias outras, têm as florestas como provedoras e, em tese, deveriam interessar-se pela sua preservação, por meio de manejos planejados e sustentáveis, para garantir que elas continuem provendo de forma constante e ininterrupta, o que nem sempre acontece, ou, melhor, pouco acontece.
Serviços de suporte. As folhas e até mesmo os troncos das árvores mortas decompõem-se (húmus) e ajudam na formação de solo fértil; a quantidade da formação de húmus guarda uma relação direta com a densidade e o tamanho das matas. As árvores adultas contribuem com crescimento das plantas ao fornecerem abrigo adequado para que as sementes lançadas ao solo germinem, cresçam e se transformem em árvores adultas. E, assim, renovam a vida de forma cíclica. A profusão de raízes nas matas, com algumas atingindo grande profundidade, na busca e água e nutrientes, contribuem para a descompactação do solo de forma natural, lenta e gradual. Quanto maior a mata e quanto maior a sua biodiversidade botânica, maior deverá ser a sua biodiversidade faunística, graças ao fornecimento de alimentos em quantidade e qualidade para as mais diversas espécies animais, partindo dos minúsculos insetos, passando pelos répteis, pelas aves e chegando aos mamíferos. A existência de matas próximas às áreas agrícolas é muito útil, pois a sua entomofauna diversificada pode contribuir com o equilíbrio ecológico das roças plantadas. O papel das abelhas, muito comuns nas matas, para a polinização das flores é um bom exemplo da contribuição dos insetos para a agricultura; há muitos exemplos a serem citados, não é o caso aqui.
Serviços culturais. Guardam uma relação direta com os seres humanos. As matas são lugares de visitação turística que podem ser de caráter educativo ou meramente contemplativo, de práticas esportivas diversas, como o arvorismo e as trilhas. Antigamente havia a caça de animais, hoje ela é proibida, ainda bem, e só acontece na clandestinidade. As florestas também são espetáculos de beleza e têm por isso grande valor estético. A própria trajetória da espiritualidade humana tem a ver com elas. O uso de plantas enteógenas (plantas de poder) pelos povos é muito antiga, desde a pré-história da humanidade, há muitos milênios. A palavra enteógeno significa "manifestação interior do divino" e as plantas que possibilitam tal manifestação foram primeiramente extraídas das matas pelos sacerdotes e sacerdotisas de antigas religiões. Um bom exemplo dessa prática antiga é o Santo Daime, originário da floresta amazônica, que deriva da combinação de um cipó (jagube) com as folhas de uma árvore de pequeno porte (chacrona).
Depois de todo o exposto acima, pretendo ater-me a um aspecto particular dos serviços culturais prestados pelas florestas e pelas árvores, o aspecto estético. Durante a minha explanação acabarei me reportando a outros serviços, mas o mais importante a partir daqui será a beleza e ela, quando pensamos nas flora brasileira, liga-se a sua diversidade. Pode ser a da mata atlântica, do cerrado, da caatinga ou da Amazônia, tanto faz.
O Estado de São Paulo já teve no passado uma grande cobertura vegetal, tanto na mata atlântica, na sua porção leste, quanto no cerrado, no oeste. A monocultura cafeeira, a partir do final do século XIX, avançou pelo seu território e devastou os dois sistemas. Durante o século XX, outras monoculturas também se desenvolveram e hoje resta muito pouco das florestas originais. Nos dias de hoje, no século XXI, predomina outra monocultura, a da cana-de-açúcar.
Quando viajamos pelas rodovias paulistas, observamos dos dois lados um mar de cana. Às vezes, avistamos lá, ali, acolá alguns pequenos fragmentos de floresta, pode tratar-se de algum trecho de mata ciliar, margeando algum córrego, ou de um bosque isolado, feito uma ilha no meio do canavial, tanto faz, é muito pouco. Ai dos pobres dos passarinhos que têm poucos lugares onde construir seus ninhos. Trata-se de uma paisagem que continuamente se repete, numa monotonia construída por máquinas e homens. Às vezes, rodando por alguma estrada, até bem acostumados à monotonia dos canaviais, avistamos um assentamento de pequenos produtores rurais, um assentamento da reforma agrária, e, ali, vemos um mosaico formado por espécies vegetais diferenciadas, um quadro isolado, ilhado no mar de cana, às vezes...
E daí? Vamos erradicar os canaviais e plantar florestas em nome da beleza? Não parece muito sensato. Todavia, algumas coisas podem ser feitas. Algumas são obrigatórias por lei e precisam acontecer em algum momento; que seja o mais rápido possível. Refiro-me às áreas de proteção permanentes (APP), como a mata ciliar às margens dos rios, lagos e nascentes, e à reserva legal, que se refere a um percentual da propriedade rural que não pode ser cultivado, a não ser com espécies arbóreas. A recuperação e implantação das APPs já ajudariam a quebrar a monotonia, pois significaria a introdução de árvores em larga escala no Estado de São Paulo, tal é a gravidade da situação ambiental do Estado no que tange ao aspecto da sua cobertura vegetal.
Contudo, precisamos ir além da lei. Como ir além da lei sem ferir os interesses do agronegócio, pelo menos por enquanto? É possível? Sejamos criativos! A imaginação no poder, lembram-se? lá nos idos dos anos sessenta?
Falarei aqui de uma possibilidade que pode ter grande alcance. Ela tem a ver com monotonia das estradas margeadas pelos canaviais. Sugiro transplantarmos o conceito de mata ciliar, aplicado aos corpos d'água para as estradas. Por que não plantamos árvores durante todo o percurso das rodovias, que são muitas, muitas mesmo. Nem que seja em fila única nas margens estreitas. Nas margens mais amplas, poderiam ser cultivados pequenos bosques. Vamos ainda mais longe, pensemos nas estradas rurais, que são uma infinidade. Por que não plantamos também matas ciliares nelas. Mas tem algo importante a ser lembrado: não podemos esquecer o princípio da diversidade, que é correta do ponto de vista ecológico e que cai muito bem do ponto de vista estético. Plantemos da forma mais variada possível, com espécies nativas, exóticas, frutíferas etc. Nossas viagem ficariam mais alegres e os passarinhos deixariam de ser sem-tetos. Beleza e justiça socioecológica, por que não?
É claro que para que isso aconteça, faz-se necessária a política. Trata-se de uma questão de política pública. Os três níveis de governo, federal, estadual e municipal, com a participação da sociedade, em particular dos proprietários rurais, poderiam juntar-se com esse objetivo singular: plantar árvores em larga escala, para o bem da ecologia e da beleza. Por que não?

CANÇÃO DO EXÍLIO RURAL – UM POEMA MUITO CONCRETO

Zildo Gallo

Publicado em 4 de dezembro de 2015.
 A imagem parece uma pintura, mas é um conjunto de canaviais sem nenhuma árvore entre eles. Deles vem um combustível muito “amigo da natureza”.



O sapo não coaxa no brejo
A abelha não visita flores
A minhoca não transita subterrâneos
O pássaro não pousa na árvore

O brejo está seco
A abelha tonta esqueceu-se de voltar
O sapo suicida banhou-se envenenado
A terra da minhoca espremeu-se
Socada pelas patas emborrachadas dos gigantes
Nem sinal dos preciosos anéis invertebrados
A árvore sumiu
O pássaro sobrevivente na urbe exilou-se
Antes dele foi-se o último dos humanos

Nos campos enfileiram-se canas adocicadas
Um mar de doçuras verdemente uniforme
Monotonia silenciosa
Uma única forma de vida
Verdejante solidão
Vez ou outra se quebra a monotonia
E o dinossauro de ferro devora
Cada colmo de cada cana
Um espetáculo pouco visto
Mas em casa os resultados disso recebo
O branco açúcar da minha anestésica ração
A comida do meu cavalo mecânico

Do alto deste edifício
Neste exílio concreto
Ponho-me a cismar
Minha terra sem palmeiras
Sem canto e sabe lá...
E as aves já não gorjeiam
Nem aqui
Nem acolá

Notas explicativas: 1) a mortandade de sapos e rãs denuncia a existência de poluição, pois são animais muito sensíveis; 2) as abelhas contaminadas por agrotóxicos perdem o radar biológico, não conseguem voltar à colmeia e acabam morrendo; 3) a diminuição de áreas arborizadas diminui a biodiversidade, com o desaparecimento de mamíferos, pássaros, répteis, insetos e espécies vegetais; 4) o uso de máquinas pesadas compacta o solo, o que dificulta a sobrevivência de insetos na sua superfície e impede a infiltração da água no subsolo, aumentando o escoamento superficial das chuvas e provocando a perda de solo (erosão).


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